Dia do Escritor: quantos talentos estão misturados na multidão da calçada?

O tempo passou e a caneta foi substituída pelo teclado da máquina de escrever. (Foto: Freepik)

Por Sérgio Giacomelli*

Lembro-me da minha professora de português do ginásio ou ensino fundamental 2 no modelo atual. A professora Delma tinha uma forma rígida e honesta de conduzir as aulas. Ela passava ao meu lado, olhava meu caderno sobre a escrivaninha e dizia: “você tem a letra feia Sérgio, precisa melhorar essa letra”. Ela repetiu essa frase durante os quatro anos. Sim. Eu realmente tinha a letra feia!

Mesmo com aquele trauma eu não deixava de escrever poemas, pequenas peças teatrais para nosso grupo juvenil de teatro e, é claro, cartas para a namorada, minha esposa depois. Quando fiz o curso técnico de eletrônica, depois de seis meses praticando a letra técnica, é que melhorei minha escrita. Acredito que a professora Delma ficaria satisfeita!

O tempo passou e a caneta foi substituída pelo teclado da máquina de escrever, depois pelos computadores, e fui deixando para trás, mas não esquecido, aquele trauma dos quatro anos de ginásio. Muitos poemas e textos foram engavetados, ou melhor, arquivados com o passar dos anos. A profissão de engenheiro eletricista tomou conta da minha vida e fui engolido na insana rotina do dia a dia, mas os arquivos continuavam crescendo.

Eu havia passado dos 50 anos quando um dia resolvi que escreveria um romance. Sem pretensões alguma, meu objetivo era entregar a alguém da família ou algum amigo gentil que quisesse ler e me devolver. Mas fui surpreendido quando mostrei para uma amiga o primeiro capítulo. Não duvidando de minha capacidade, ela inicialmente pensou que eu tivesse copiado de algum livro.

Mostrei o segundo capítulo, terceiro e lá pelo sexto ela sugeriu juntar um grupo de pessoas para ler meus escritos, porque eu acreditava que ela estava me elogiando apenas para agradar seu amigo, eu. Ela quis provar que eu estava aflorando minha carreira de escritor. Ela estava certa!

Depois de ter publicado meu livro e estar quase finalizando o segundo, pergunto-me quantos como eu tiveram sua criatividade podada por um mero detalhe como a letra feia? Conjugação de verbos, análise sintática, enfim, comentários negativos? Esses mesmos que não tiveram sua criatividade vista e valorizada por alguém que os incentivasse. Quantos escritores e escritoras de talento estão misturados na multidão da calçada?

Citei o exemplo da escrita para elucidar o desperdício de talentos. Olhe em sua volta, observe se alguém possui algum talento ou habilidade positiva e incentive-o, valorize. Não falo apenas no campo das artes, mas no vasto mundo do ser humano, da essência do “ser” humano.

Parabéns a todos os escritores que, cedo ou tarde, descobriram e praticaram seu talento e sua habilidade de traduzir seus pensamentos em palavras que aguçam as emoções das pessoas.

*Sérgio Giacomelli é escritor, engenheiro eletricista, nascido em São Miguel do Oeste/SC, passou a infância e a juventude entre a cidade e o campo.

Viveu muitos anos em Ribeirão Preto/SP e na capital paulista, hoje segue a vida profissional em Belo Horizonte/MG.

Apaixonado por pesquisas, é descendente de italianos e coloca essas particularidades no romance de época D’Angelo – O Viajante de Conca.

Foto: Maria Carolina Fonseca Reis

#DiadoEscritor #SergioGiacomelli

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