Pacientes obesas: como melhor atendê-las nos tratamentos de infertilidade?

Os efeitos negativos da obesidade sobre a fertilidade são conhecidos há muito tempo.
Os efeitos negativos da obesidade sobre a fertilidade são conhecidos há muito tempo.

obesidade é uma doença crônica que afeta um número elevado de pessoas em todo o mundo. Um levantamento do Ministério da Saúde revela que 51% da população brasileira estão acima do peso. Em 2006, este percentual era de 43%. Homens ainda são a maioria, 54%, mas  entre as mulheres o índice chega a 48%.

Assim, o percentual de pessoas com excesso de peso superou, pela primeira vez, mais da metade da população brasileira. É uma verdadeira epidemia, um termo que se enquadra na incidência crescente da obesidade no Brasil e no mundo nos dias de hoje. A pesquisa Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel, 2012), do Ministério da Saúde, mostrou que 51% da população acima de 18 anos estão acima do peso ideal. Em 2006, o índice era de 43%. Isso é muito preocupante, pois estar com excesso de peso afeta vários sistemas do organismo, prejudicando, inclusive, a fertilidade.

“Os efeitos negativos da obesidade sobre a fertilidade são conhecidos há muito tempo. Em 410 aC, Hipócrates, o médico mais famoso da Antiguidade, escreveu sobre mulheres portadoras de excesso de peso: ‘As pessoas de tal constituição não conseguem procriar. Gordura e flacidez são os culpados. O útero é incapaz de receber o sêmen e elas menstruam infrequentemente e pouco’”, afirma o especialista em reprodução humana, Arnaldo Cambiaghi, diretor do IPGO.

Ele acrescenta que muitos estudos já demonstraram um impacto negativo da obesidade sobre a fertilidade, levando a mulher a não ovular, ter uma menor resposta ovariana, menor qualidade do óvulo, do embrião e endométrio, além  taxas de implantação mais baixas e um aumento do risco de abortos. Esses efeitos negativos devem-se a influência de excesso de tecido adiposo,  da   produção de hormônios e proteínas envolvidas no processo de reprodução.

O que é obesidade?

Na maioria das vezes, avalia-se a obesidade por meio do cálculo do Índice de Massa Corporal (IMC). Ele é feito da seguinte forma: divide-se o peso (em quilos) do paciente pela sua altura (em metros) elevada ao quadrado (Figura 1). De acordo com o padrão utilizado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), quando o resultado fica entre 18,5 e 24,9, o peso é considerado normal. Entre 25,0 e 29,9 sobrepeso, e, acima deste valor, a pessoa é considerada obesa. O sobrepeso ocorre quando há mais gordura no corpo do que o ideal para uma vida saudável. A obesidade se dá quando o acúmulo de gordura está muito acima do normal, podendo gerar até problemas graves de saúde. Já a obesidade mórbida é quando o valor do IMC ultrapassa 40. Nesse caso, o tratamento inicial, além das mudanças de estilo de vida, sempre inclui medicamentos e até cirurgia bariátrica pode ser recomendada. 

CÁLCULO DO IMC

image003Segundo a OMS, o IMC corresponde aos seguintes estados nutricionais:

Abaixo de 18,5 – magreza patológica
De 18 a 20 – magreza
De 20 a 25 – peso normal
De 25 a 30 –  sobrepeso
Acima de 30 – obesidade
Acima de 40 – obesidade mórbida

Qual é o IMC ideal? 

O IMC ideal está entre 20 e 25, podendo ser aceitável até 30. Homens e mulheres que têm IMC abaixo de 20 ou acima de 30 terão sua fertilidade prejudicada. Alguns estudos demonstram que homens com IMC maior do que 25 têm maior índice de fragmentação do DNA do espermatozoide, o que pode levar a falha no processo de fertilização. A obesidade masculina pode levar ainda a alterações hormonais. Ela está relacionada à redução da testosterona, o que pode levar a redução de libido e a problemas de ereção.

“As mulheres com peso acima do normal podem ter menstruações irregulares ou até mesmo não menstruarem e nem terem ovulação. Isto ocorre porque, uma vez que o hormônio estrogênio é produzido no ovário e no tecido gorduroso, ao haver gordura demais, o corpo produz mais estrogênio, interferindo, assim, no ciclo menstrual e na ovulação, além de estar associada à Síndrome dos Ovários Policísticos (SOP). Existe uma redução dos níveis de hormônios femininos e aumento no nível dos masculinizantes. As mulheres têm aumento de pelos, irregularidade menstrual e redução da fertilidade”, alerta Cambiaghi.

Além de diminuir a chance de gravidez espontânea, a obesidade também dificulta os tratamentos de reprodução assistida de diversas formas, por exemplo:

  • Imagens de  ultrassom prejudicadas.
  • Taxas de sucesso mais pobres dos tratamentos de fertilidade em mulheres com sobrepeso e obesidade.
  • Tratamentos de fertilidade apresentam riscos adicionais nessa população.
  • Há necessidade de um processo de estimulação mais agressivo com doses mais elevadas dos medicamentos.
  • A absorção pela via subcutânea, principal meio de utilização dos medicamentos estimuladores dos ovários,  pode ser prejudicada nas pacientes obesas, sendo preferível a opção intramuscular. Esta via, além de ser mais dolorosa, dificulta a autoaplicação, sendo normalmente necessário ir a uma farmácia, clínica ou hospital.
  • Há maior chance de uma má resposta à estimulação ovariana.
  • Em geral, há um número menor de embriõesexcedentes de boa qualidade.
  • Menores taxas de gravidez.
  • Maiores taxas de aborto.

Se uma gravidez é alcançada, a obesidade está associada, ainda, a diversas complicações, a saber:

  • Distúrbios hipertensivos (incluindo um maior risco de pré-eclâmpsia);
  • Diabetes gestacional;
  • Trabalho de parto prolongado;
  • Maior incidência de parto por cesárea;
  • Macrossomia (“síndrome do bebê grande”);
  • Distócia do ombro no momento do parto (uma emergência obstétrica onde o ombro do bebê não passa pela bacia);
  • Aumento da perda de sangue;
  • Aumento da necessidade de cuidados intensivos  neonatais.

Assim, estar com sobrepeso ou obesidade acarreta maiores custos diretos e indiretos dos tratamentos de infertilidade, menor taxa de sucesso e prejuízo no resultado obstétrico e perinatal, além de um risco aumentado para mãe e feto. Devido a isso, muitos serviços não fazem tratamento de reprodução em pacientes obesas.

Essa conduta é alvo de muitas críticas, sendo considerada discriminatória, principalmente se levarmos em consideração alguns pontos:

–  Há muita dificuldade em se implementar uma política de controle de peso para o tratamento de infertilidade;

–  A eficácia de programas de perda de peso no tratamento da obesidade é limitada;

–  Os valores de corte do IMC são arbitrários;

–  As questões da estigmatização e discriminação do obeso;

–  Esta conduta fere a autonomia da paciente que, mesmo ciente dos riscos, deseja realizar o tratamento.

Opinião do IPGO

Por tudo isso, embora algumas clínicas de tratamento da infertilidade tenham a tendência de barrar os tratamentos em mulheres obesas, o IPGO procura cuidar com uma atenção especial destas mulheres (e homens também), focando na adaptação do melhor tratamento. Realiza-se um programa individualizado e customizado. “Afinal de contas, dificuldades existem e estamos acostumados a enfrentar casos difíceis como, por exemplo, os tratamentos em mulheres mais velhas, cujas chances de uma gravidez bem sucedida são bastante baixas. A idade não é modificável, mas é possível perder peso com um tratamento médico adequado. Além disso, nem todas as mulheres com sobrepeso ou obesas têm problemas de saúde como diabetes ou pressão arterial elevada, o que significa que os riscos não são maiores do que naquelas magras com esses problemas”, admite o médico.

Assim, apesar de orientar a importância da perda de peso, e oferecer um programa de auxílio neste processo, o IPGO realiza tratamentos de reprodução assistida nessas pacientes, mesmo que não tenham perdido peso. Entre os argumentos estão:

– Muitas pacientes têm várias dificuldades em perder peso. A ansiedade com a infertilidade, muitas vezes, dificulta ainda mais esse processo e muitas não conseguem atingir o peso ideal.

– A idade é um fator muito importante na chance de sucesso dos tratamentos de reprodução assistida. Quanto maior, menor a chance. Adiar a gravidez, principalmente em pacientes com idade avançada ou baixa reserva ovariana causará mais malefício que um possível benefício que se poderia ter com a perda de peso.

– Apesar de alguns estudos demonstrarem chances menores de sucesso em pacientes obesas, essa verdade não é absoluta, pois alguns estudos não confirmam esta diferença.

– Mesmo que consideremos uma menor chance de sucesso e uma dificuldade aumentada nos tratamentos de reprodução assistida, essas pacientes não são intratáveis.

– Com um pré-natal e controle clínico rigoroso, a gravidez de pacientes obesas tem alta chance de ir bem.

“Assim, o IPGO não contraindica o tratamento de reprodução assistida em pacientes obesas, mas orienta a perda de peso, visto os benefícios que podem ser adquiridos. A boa notícia é que mesmo uma modesta perda de peso aumenta substancialmente as taxas de ovulação e gravidez em mulheres obesas que tinham problemas de ovulação”, afirma Cambiaghi.

Um estudo com pacientes obesas anovulatórias demonstrou que mesmo uma perda entre 5% a 15% do peso corporal foi associada com a retomada da ovulação, melhor resposta à estimulação ovariana, mais taxa de gravidezes espontâneas e que tiveram nascidos vivos, além de outros benefícios para a saúde. Mulheres que procuram tratamento de fertilidade devem, portanto, ser aconselhadas a96 receberem tratamentos de obesidade estruturados, cuja eficiência tem sido demonstrada, incluindo a cirurgia bariátrica (em casos mais graves).

Estudos científicos em grupos de mulheres obesas (IMC > 30) e inférteis têm demonstrado que muitas delas engravidaram quando perderam 10% do peso. Outros benefícios hormonais também são observados com a perda do peso, como a redução da glicemia, andrógenos (hormônios masculinos que também atrapalham a ovulação) e diminuição da resistência à insulina, alteração que está relacionada à anovulação e ovários policísticos. 

Dicas do IPGO para pacientes que serão a tratamentos de Fertilização e estão acima do peso avaliado pelo IMC 

1-Pacientes com idade inferior a 35 anos e com boa reserva ovariana 

IMC > 30 e < 40

1- Perca pelo menos 10% do seu peso. Isto já aumenta muito as chances de gravidez. Deve-se tentar inicialmente com dieta e exercícios, mas, se necessário, tratamento medicamentoso (orlistat, sibutramina, etc.) pode ser útil.

2- O uso da Metformina como tratamento coadjuvante pode ser uma boa opção, principalmente se há resistência à insulina.

3- Se forem realizar os tratamentos de fertilização, utilizem os medicamentos injetáveis pela via intramuscular e não subcutânea.

 

IMC > 40

1- Uma grande perda de peso deve ser estimulada. Se com dieta, exercícios e tratamento medicamentoso isso não ocorrer, a cirurgia BARIÁTRICA deve ser pensada.

2- Após a cirurgia bariátrica, aguardar 12 a 18 meses para a gestação.

3- Metformina, como tratamento coadjuvante, pode ser uma boa opção se a resistência à insulina continuar mesmo após perda de peso.

 

2-Pacientes que não podem adiar o tratamento de reprodução assistida (idade superior avançada,  reserva ovariana diminuída etc.)

IMC > 30

1- O tratamento deve ser iniciado mesmo sem perda de peso.

2- O uso da Metformina, como tratamento coadjuvante, pode ser uma boa opção, principalmente se houver resistência à insulina.

3- Se for realizar o tratamento de fertilização, utilize os medicamentos injetáveis pela via intramuscular e não subcutânea.

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